"yesterday i got so old
i felt like i could die
yesterday i got so old
it made me want to cry"
In between days, The Cure


acho que eu atraio gente passando, ou prestes a passar, pelo Retorno de Saturno, porque se tem algo que me acontece com certa frequência é alguém pedindo prá "dar uma olhadinha no meu mapa", por estar com algum problema brabo, ou se sentindo meio esquisito - geralmente com depressão ou com uma sensação de estar carregando o mundo nas costas. então só de dar um olhada da data de nascimento da pessoa tudo se esclarece: 28, 29 anos (às vezes até um pouco antes disso)? tem cheiro de Retorno de Saturno, babe.

fala-se muito do tal Retorno, mas como tem muita informação errada circulando por aí, e como pouca gente se dá ao trabalho de visitar um bom site de astrologia prá saber o que é, vou tentar explicar.

quando a gente nasce, os planetas todos estão lá, cada um numa determinada posição do zodíaco. só que eles são dinâmicos, eles caminham, cada um no seu passo e velocidade característicos, percorrendo os doze signos dentro de um certo tempo. sempre que cada planeta, na sua viagem pelo zodíaco, chega novamente ao mesmo ponto onde ele estava quando a gente nasceu, temos um retorno. o retorno da Lua se dá a cada mês, o do Sol, a cada ano - no dia do nosso aniversário. vivemos retornos de cada um dos planetas às vezes mais de uma vez durante a vida, menos de Netuno e Plutão, que são planetas muito lentos - Netuno leva 168 anos prá dar uma volta inteira pelo zodíaco, e Plutão, 248, e ninguém vive tanto. Saturno leva em média 28 anos. é portanto comum que se vivencie dois, até mesmo três retornos de Saturno ao longo da vida.

mas o que isso significa, afinal? a grosso modo, sem querer entrar em detalhes de como funcionam os aspectos planetários, podemos dizer que cada retorno tende a potencializar o simbolismo daquele planeta em nós. sentimos a sua influência bastante amplificada. Saturno, por exemplo, é um planeta de estruturas. é ele quem organiza, quem dá forma, arcabouço, é ele quem cristaliza e torna real. portanto, a cada vez que Saturno voltar à mesma posição em que ele estava no momento do nosso nascimento, vamos sentir um impulso muito forte para criar estruturas, para cair na real e dar uma organizada na vida. isso muitas vezes não é consciente, mas vêm na forma de acontecimentos que forçam a gente a tomar esse tipo de resolução, muitas vezes a contragosto. é muito comum que nós encaremos esses acontecimentos como verdadeiras crises, e que até procuremos resistir com medo de perder aquilo que já conquistamos e que nos é tão confortável.

no primeiro Retorno, que como eu já disse acontece em média entre os 27-29 anos, somos forçados de uma forma muito peculiar a encarar certas "verdades" da vida. eu costumo dizer que é depois do Retorno de Saturno que se vira "gente". como Saturno é um planeta ligado ao elemento Terra, ou a tudo aquilo que mantém ligados ao plano físico, é comum aparecerem as crises que nos obrigam a manter os pés no chão. o povo que vive com a cabeça nas nuvens tende a sofrer consideravelmente durante essa fase, os dependentes de algo/alguém que faça o papel de papai ou mamãe também. no Retorno tomamos consciência de certas ilusões que até então pareciam muito reais. insegurança, medo, reais ou infundados, vêm à tona. comeca uma série de questionamentos a respeito do nosso lugar no mundo, a respeito do que realmente queremos para nós mesmos, a nível de estrutura, material ou emocional. é aqui que os famigerados "sonhos de juventude" viram fumaça. é aqui que sentimos que precisamos "ser alguém", amadurecer, pois afinal a ameaça do tempo se estende sobre nós como uma nuvem negra. é no Retorno que muita gente passa uma crise braba em casa e se vê forçado a parar de depender da família (ou do marido) para continuar existindo; é no Retorno que muitos relacionamentos acabam porque de repente passamos a enxergar uma outra realidade, seja na pessoa com a qual nos relacionamos ou na própria relação em si; é no Retorno que muitas vezes nos vemos diante de uma situação que nos obriga a uma total reformulação de hábitos e valores em prol de algo maior e mais importante. a palavra-chave para o momento é responsabilidade. e porque responsabilidade tende a tolher, restringir, a nos roubar o direito de fazer o que queremos na hora em que temos vontade, Saturno é encarado como um elefante que senta em cima da gente e não nos deixa respirar. mas quando o elefante resolve sair de cima, acreditem, a gente se vê diferente, mais seguros de nós mesmos, mais maduros e centrados.

quando a gente é adolescente, sonha com os 20 como se fosse a melhor coisa do mundo. como se aquela fase representasse tudo o que a gente sonha em matéria de realização e segurança. e é frustrante perceber que, em geral, não é. nos primeiros anos continuamos tão frustrados e com tantos questionamntos como qualquer adolescente. vivemos o conflito de que não somos mais teens mas por dentro nos sentimos (e até continuamos a nos comportar) como se ainda fôssemos. isso tudo gera um desconforto, pois não sabemos se é anormal continuar nos sentindo e comportando daquele jeito. as coisas começam a mudar um pouco de foco quando o Retorno de Saturno se aproxima, e na época exata do retorno, a gente começa a se cobrar tudo o que sonhávamos realizar quando estivéssemos na casa dos 20 e não aconteceu. eu tinha acabado de completar 29 anos quando meu Saturno voltou. não me lembro de ter ficado particularmente deprimida (afinal, já conhecia essa face de Saturno, tive depressão crônica desde a infância), mas o conflito idade versus realização profissional ficou muito contundente. eu me via com quase 30 anos, formada em moda, 10 anos de teatro nas costas e uma banda de dark folk, mas não tinha nada, não havia construído nada com todo aquele background. resolvi então dar uma "forma" pra tudo o que sabia e voltar prá faculdade de artes, que abandonara aos 21 anos por não saber se queria realmente aquilo (queria), e comecei a estudar para o vestibular da Uerj, já que não tinha mais papai pagando a facul particular, como da primeira vez. foi o ponto de partida para me sentir mais integrada na minha realidade e para começar a perceber quem eu era de verdade, qual era o meu caminho na vida. a partir daí comecei a me sentir mais segura a respeito das coisas que queria. claro que virei a mesa quando mal havia começado a carreira no magistério e a me sentir "alguém", causando uma série de outros desconfortos, mas isso já é uma outra história.

aos que estão vivendo, ou prestes a viver o Retorno de Saturno, eu digo vai passar. e que depois tudo fica melhor (se não melhorarem, é porque você não conseguiu deixar prá trás aquilo que precisava ir). você vai começar a olhar o mundo por trás de outras lentes, menos coloridas, é verdade, porém, mais reais.

comece fazendo uma lista de todos os seus medos e inseguranças. depois reflita sobre cada um deles, em como eles nasceram, e de onde. pense no que você pode fazer para não ter mais medo. pense em situações passadas de invulnerabilidade e insegurança e no que você fez para superá-las (correr não vale.) se você é ligado a artes ou artesanato, procure trabalhar em objetos tridimensionais. molde barro. crie estruturas, maquetes, coisas que precisem de uma solução para ficarem de pé. quando esse tipo de energia planetária se manifesta em nós, a grande sacada é trabalhar com ela, não fugir dela. organize-se, trabalhe, defina metas. construa, cristalize. não é tempo de desperdícios ou de viver irresponsavelmente, nem de bancar o bebê chorão. você pode perceber que as coisas vão caminhando meio lentamente, mas o que vem sob a influência de Saturno, vem para ficar. abrace a oportunidade.

a bela imagem acima, que ilustra bem o que o Retorno de Saturno significa, é da autoria de Powel Jonca, de quem não encontrei nada sobre na internet.

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